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Galhos da separação

 


GALHOS DA SEPARAÇÃO

 Pedro Moreira Nt.
                  
                     As árvores são assim. Vivem de raízes para cima no inverno, na terra está o fruto que não veio. E o parque, a floresta, um jardim de sombras altas. 
Quando separa fica a caveira no céu. E é lindo a dor quieta de vento que uiva. É cômica a nudez da árvore. Também horrível, lindo e trágico. Separar sugere a impossibilidade de construir a união. Digo isso porque no que está unido a separação só pode ser realizada através de muito sofrimento de ambas as partes. Para muitos não é fácil separar, necessita-se de muitas marteladas para desunir. Se fizermos uma comparação com a carpintaria, vamos ver que a cumeeira de uma casa subsiste às intempéries devido ao conhecimento profundo dos encaixes, segue a isso o tipo de madeira, o formato de cada recorte, as variantes técnicas a serem utilizadas, além disso, a colagem, bitolas,  a espessura dos pregos sem contar com o onde e como utilizar. A arte do arquiteto entra nisso como aquele que une e dá a tudo que está preparado o acabamento. Trata-se de um trabalho que dá forma e uma característica. Então uma casa pode desabar se não for bem construída, se não houver nela a união.
                  Assim o casamento, as relações afetivas também passam por um projeto arquitetônico de uma casa.  As partes que a formam, as divisões, os motivos a serem aplicados estão da mesma forma integradas. Os materiais que formam as relações tanto objetivas quanto subjetivas devem passar por um programa de qualidade que garanta a sustentação do telhado relacional. A construção do lar tem essa necessidade evidente do fogo sagrado, de haver nele aconchego, nesse sentido, fazer a concha, proteger é a mais importante razão da arquitetura da união. Mais a mais é muito galho e ramo, tronco, raiz e ssa loucura e sugar o subterrâneo para conter o inaudito. 
Cada pássaro no seu vento. A comunhão tem peso de ouro entre dedos e sol dourado distante. É muito cansativo ser árvore de nós e cascas a verticalizar a vida rasteira. Melhor trepadeira, sobe logo, mostra a que veio com sua perenidade de flor e espinhos. 
                  Unir, portanto, não pode estar distante do sentido de segurança e proteção, essa busca humana de encontrar no outro a parte que possibilita erigir com certezas se faz dependente de como vemos o outro, aquele com quem dividiremos nosso tempo existencial para uma profícua união afetiva. É importante também percebermos que se trata de integração de valores humanos, de frutificar saberes e de promoção do bem-estar.
                  Torna-se  "uteral" o mundo de casa, de saídas, de portas e janelas. Criador de criaturas, assim revertendo o lugar. Joga-se fora o mágico e sagrado com as palavras muito bem separadas para cada qual instante. E retornar a esse lugar deixado, o oco que o nada produz é muito bonito. É como reencontrar a fonte da vida nas coisas, no automóvel, no escritório, e, por fim em outra estação. Tudo isso parece extremamente linear e complexo quando transferimos a carpintaria da casa para as relações.
A madeira da árvore e também o cimento são crivados de pregos. 
                  A história da família mostra bem como foram levantadas cada tábua da união. De um lado a mulher como moeda, como messe, lugar de plantio, de fecundidade, de mágica que faz brotar a vida, de subserviência, dependência do masculino para a conquista de seus desejos, suas vontades. E de outro o homem provedor, trabalhador, lutador - uma grande bobagem. Caminhamos sem mais lonjuras atrás de da prestação e os juros. Promessas de durabilidade em que o fruto podre alimenta os dispersos. Ideais, caça e  provisão do lar que morre docemente no brasido fumacento da realidade.
As mãos ramificam, criam folhas e acabam na função e utilidade de onde se concebe a vida.  O tempo marcado por altos e baixos e úteis em sua serventia para o desenvolvimento. 
                  A separação tem esse gosto de caldas de frutas enlatadas, deliciosas, mas que necessitam serem todas abertas e despejadas na mais transparente louça. A perspectiva funcional das partes em viverem suas vontades no modismo, em desejos tão marcados, com suas plaquetas, etiquetas e formas variadas, como igrejas. São magníficas garantias dessa individualidade quem sabe dependente de uma boa pensão, ou de uma vantagem, quem sabe interesse, promoção, e por outro lado a um consumo multiplicado por dois sai caro. Cansa.
Aprovada a compra da geladeira. Ótimo, na separação poucos ficam com a frieza ou se sente derrotados. Separar é conviver. Amar é subir na árvore. Esticar a alma na forquilha. Tomada a decisão a separação se relaciona à produtividade é o resultado do desmatamento.
                 O homem separado se vê como um ente funcional, cuja função não é mais exeqüível nessa relação, tornando-se apenas utilitário como razão de sua existência.
                  Com a separação, aqui traduzida como emancipação do parceiro ou parceira é sempre a perda. Não que se perdeu algo. A gente enfia a faca na terra que é o rabo do diabo e acha.  A perda de convivido. Se não conhecesse, não encontrasse não teria a  separação e a lembrança de ter a perda, de ter esquecido que juntos somos árvores no atropelo dos tempos, roçamos os galhos na nossa mesmice de ordem e deixamos que se empoleirem os cagões que fazem ninho, trepam e somem. 
Parece ser mesmo perda de identidade,punição. Tanto árvore tem essas lesmas viventes como o ajuntamento matrimonial. Mas é divertido. Sentidos em uma vida individual.   
                 A separação é a dissolução da comunidade familiar, um alívio. Não fosse a memória que é rápida e se mete a mostrar-se viva.  Segue a raiz quieta no submerso submundo de outra relação ou se mantém segura no vento. Quando percebo essa madereira toda, sinceramente, ser árvore não é fácil.








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